terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Utopia que dói..


"Segredo"

Esta noite morri muitas vezes, à espera
de um sonho que viesse de repente
e às escuras dançasse com a minha alma
enquanto fosses tu a conduzir
o seu ritmo assombrado nas trevas do corpo,
toda a espiral das horas que se erguessem
no poço dos sentidos. Quem és tu,
promessa imaginária que me ensina
a decifrar as intenções do vento,
a música da chuva nas janelas
sob o frio de fevereiro? O amor
ofereceu-me o teu rosto absoluto,
projectou os teus olhos no meu céu
e segreda-me agora uma palavra:
o teu nome - essa última fala da última
estrela quase a morrer
pouco a pouco embebida no meu próprio sangue
e o meu sangue à procura do teu coração.


Fernando Pinto do Amaral

quarta-feira, 28 de julho de 2010

Ser auto-trófico

Afirmo-me um ser auto-trófico, logo produzo a minha própria energia e matéria, pois eu não me alimento de comida que se possa comprar e cozinhar, mas sim dos poemas que eu próprio escrevo. Mas só redigi-los e nutrir-me deles não chega, é preciso que os outros, as pessoas que me rodeiam os leiam para que eu possa assim fazer a minha digestão e não morrer de dores de tédio e ansiedade insuportáveis. E passo a explicar e repiso, que não é preciso que os demais leiam e digam bem do que rabisco, podem dizer mal desde que leiam e critiquem.
Ás vezes as pessoas perguntam-me: então qual foi o poema que gostaste mais de fazer? E eu respondo: «o próximo, pois cada poema que faço atinge a um determinado instante um auge de felicidade, e é desse cume que procuro sempre».

António Seia

Ser


Queria ir em direcção ao nada,
sem destino,
sem uma única coordenada.

Queria alodialmente não estar só,
ser selvagem,
e respirar desigual dos outros.

Gostava mesmo era de ouvir mais,
pois a natureza fala tanto,
mas ninguém lhe faz caso.

Cada melodia do pássaro,
cada ramalhar da árvore,
cada sussurrado do vale,
cada passar do rio.

Pretendo ao menos uma vez,
voar livre nas asas do vento,
gritar até escassear o fôlego,
ser livre como o rio que corre e decorre quando quer.

Solto como as pétalas na brisa do verão,
Livre como em queda livre nos céus abertos,
Apartado como uma águia desaparecendo no horizonte.

Desejo ser corda de uma guitarra,
ser doce,
cantar o fado e a noite,
harmonizando todos os sons
unidos numa única pauta.

Queria isolar-me no auge da serra,
saborear o vento que não me cerra,
embeber a naturalidade de tudo,
ler Torga,
Ser...

Maia, 4 de Maio de 2009
António Seia

Sede perturbadora

Tenho fome,
de unir letras e versejar,
e da ponte do insaciável
não consigo atravessar.
É um vazio oco, que por nada
nada sem água o meu estômago.

Sinto sede de viajar infinitamente,
erguer o polegar por boleia ao tempo,
e ao seu sabor doce me embeber.
Contudo, o copo está vazio.

Ser turista,
isso é coisa de amadores,
e exuberantemente superficial,
apenas para quem frui de bom capital.

Eu desejo e preciso de algo além,
ser como um velho viajante,
cuja bengala e sabedoria,
conhecem e já cumprimentaram a alma
de todas as paisagens e vistas miradas,
todos os rios e oceanos cruzados, todas as
ruas e trilhos não mapeados...

Porém, o copo permanece vazio...

Maia, 22 de Janeiro de 2010 António Seia

Viagem Sonhada

Despido das suas velas,
icei-as,
parti no barco dos sonhos.

Navegava eu para o meu destino,
apenas numa gota de oceano,
mas era tão além e moroso...

Naveguei então noutro rumo,
e ali,
ali nada era como um breve sopro,
que se extingue no ar...

Ali,
a enigmática noite aparecia,
e trazia todas as pétalas das estrelas,
as quais eu colhia,
e ao lado,
uma imensa esfera colorida de branco,
que me sussurrou em tinta indelével
os versos de um poema,
onde tudo eram marés favoráveis e certas,
algo quimérico e cantado conforme o Fado,
mas ainda tão pouco imaginado...

E por isso,
falei ao céu:
Não consigo aportar o meu sonho...
E o sábio respondeu-me:
Em qualquer viagem,
o essencial é o percurso que tomamos,
pois é ele que nos compõe a memória.
O destino final,
é apenas mais um marco na história.

Maia, 8 de Julho de 2009
António Seia

Solstício d’Inverno

Tristes encontravam-se alguns,
outros ficavam radiantes.

Uns subiam as escadas,
para a tal cidade de Deus.
Outros desciam-nas, para cá ficarem,
conforme outrora o fez o menino.

Um solstício bem amargo esse.

Nem a neve melancólica caiava as ruas,
nem o frio ardente gelava,
nem a família disjunta unia,
nem a lareira me aquecia.

É isto que sois, Natal?
Dias lerdos e cansados
que nos travam os sorrisos?

Assim vos escrevo,
assim vos aviso,
para que componhais este Dezembro
com menos improviso.


Maia, 14 de Dezembro de 2009
António Seia

Leitura d'outrora

Eu era apenas mais um livro,
na companhia de páginas numeradas,
que contavam histórias verosímeis.

Um livro jovem,
pois quando desfolhado,
ainda cheirava a novo,
gritando a inacabado,
e muito pálido por dentro.

Redijo-me objectivamente,
logo, só eu narro o que lês,
e passa-se num lugar algures ai,
desse lado da janela,
onde avistando o céu estrelado imenso
como letras a desaguar
como um rio sem nascente nem foz,
me afogava no escuro da negridão.

Uma busca insaciável de uma margem
onde me pudesse apoiar,
e de um cais onde aportar.

Mas,
cada capitulo é uma era distinta,
porque o que era já fui,
(e gosto de pensar que foi
uma fase efémera),
o que fui já não sou,
e o que sou ainda está por imprimir.



Lisboa, 6 de Janeiro de 2010
António Seia

sábado, 5 de junho de 2010

O Gato e a Gaivota

para a minha mãe

Alacridades que tremeluzem,
mágoas que marcam,
queixumes supérfluos,
cóleras sobejas,
lá estás, estiveste, estarás…
Primeira fila perpetuamente,
enxergando o concerto
como quem fita o horizonte de perto.

Larguemos agora o olhar, já é hora,
todavia, não abatamos essa corrente oculta
que corre e nos ata
daquilo a que dão o nome de amor,
mas muito menos trivial,
muito mais nosso.

Não abatamos o insofismável para os outros,
composto de melodias sincopadas,
que só nós ouvimos verdadeiramente.

Se não houvesses Tu
não existia Eu,
e o Nós era quebrado.

Maia, 2 de Junho de 2010
André Cerqueira

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

"1km de cada vez"



"É essa a matriz fundamental deste livro: a alegria da viagem preguiçosa. Um olhar pelo mundo em slow motion - mais do que um olhar que viaja devagar, uma reflexão que viaja parada. Uma espécie de maturidade dos passos, que têm tempo para perder tempo com os lugares, as situações, os encontros e reencontros que o mereçam. Que têm tempo para ler livros nos territórios onde eles foram escritos ou ambientados. Que têm tempo para honrar culturas e idiomas distantes e desconhecidos. E prestar uma vassalagem serena e profunda aos pormenores geralmente invisíveis ou desprezados do acto de viajar."

"As melhores coisas do Mundo são gratuitas"

"Para o viajante preguiçoso o contrario de viajar não é ficar em casa, mas sentir-se em casa. O viajante preguiçoso e aquele que não tem pressa de mudar de sitio....um turista apenas procura, um viajante deixa-se perder."

"O sedentário esta perdido porque tem um destino a encontrar que não encontra. O nómada não procura, encontra-se no próprio acto de viajar."

"Não é verdade que o planeta seja redondo. É armilar. Anda-se às voltas e nunca se regressa ao mesmo sítio. A estrada, sim, passa por lá; mas o tempo também passa, e leva de nós o que fomos antes. Falta-nos o mesmo momento para podermos regressar ao mesmo sítio. Regressamos já outros, e compreendemos que o sítio já não é o mesmo."

"O que conta na vida não é a duração, é a sua intensidade."

"Dou mais valor a um minuto que a um cêntimo."

Um livro que ensina a ser um viajante, ou pelo menos, mostra a perspectiva de um. As suas experiências, encontros, desencontros, lugares, musicas...
Paginas que nos transmitem como pertencer a uma viagem, e não apenas, chegar, chegar e "turisticar".

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

N.R.P. Sagres - 3ª circum-navegação

Bons ventos e marés vos acompanhem na 3ª viagem de circum-navegação da Sagres, a vós que seguram o leme da barca á vela mais bela deste mundo e dos outros. Votos de uma belíssima viagem a toda a guarnição e ao cmdt. Pedro Proença Mendes.

Viva a Sagres, e que ela navegue por muitas mais décadas...